sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

DISPO-ME DO MEDO DE SER EU


Um dia o destino concedeu-me o existir,
ainda menino percebia o aumentar dos músculos,
o esticar da pele, o ascender da vida.
Maravilhei-me com a descoberta, e me perdi na duvida,
percebi que cheguei inteiro de corpo, mas fracionado de alma,
eram pedaços por todos os lados, espalhados, amontoados,
uma desordem sem igual, um desalinho... um temor,
faltava-me essência, brotava vazios, 
doía o peito sem ter ferido a carne,
descia lagrimas sem ter tido a dor.
Foi quando o tempo fez-se de mestre, e eu de aprendiz...
Foi quando tive que recompor a mim mesmo,
andei recolhendo e resgatando pedaços de mim, pedaços de alma,
às vezes em noites de solidão,
às vezes em tardes de ventania,
às vezes em dias de calmaria.
E assim recomponho-me em sinergia,
dispo-me do medo de ser eu.
Busco-me a todo o momento, me reconheço em todas as manhãs,
sou conhecedor de mim.
Não coleciono coisas, agrego coragem para ser feliz,
sou forte, fraco, simples, imenso... calmo,
estou quase inteiro, e minha alma também.
Pactuamos celebrar o último pedaço, antes do fim,
e em devaneios, e com todo o esplendor,
gritar... a mim mesmo, que a vida é apenas um instante,
e que para ser inteiro...
o último pedaço de alma:
tem que ser amor.

Ari Mota

domingo, 23 de janeiro de 2011

ENTREGADOR DE CORAGEM

Já andei em desespero, sangrei de medo,
chorei em noites de solidão,
fiquei no abandono em madrugadas frias,
errei caminhos,
perdi-me em desertos,
tremi sozinho em aflição.
Sobrevivi ao desamparo, escapei da culpa,
supri todos os vazios da alma
repus todas as ausências,
sequei todas as lagrimas,
fiz da minha vida... calma.
Hoje... em tudo isso, e depois de tudo...
aprendi a não desistir, tento sempre,
e sempre mais um pouco... agarro-me em cada esperança,
renovo todos os meus sonhos,
alço sempre novos vôos em perseverança.
Mas... se por ventura...
os ventos da incerteza vierem acompanhados de duvidas, feito ventania,
posso sufocar com risos, seus soluços... todos os dias,
e em vertigem colocar alegria na sua dor.
Posso lhe dar colo, afogo, acarinhar sua face,
partilhar todo o meu amor.
Mas... Se, contudo entre nós existir estradas,
um horizonte que nos separa,
uma infinita distancia que nos desampara:
Não se desespere, entregarei tudo que sinto,
porque tudo...  transcende o tempo, o longo caminho,
e continuarei olhando para você com todo o carinho.
Se o destino interromper sua jornada,
e necessitar de abrigo em sua viagem,
ofereço-lhe minha alma,
vou a sua busca
entregar
coragem.

Ari Mota

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

CONCLUIR O PASSADO


Houve um tempo em que olhava para trás e alguém me perseguia,
acelerava os passos, virava as esquinas, corria...
E sempre alguém no meu rastro, pisando em minhas pegadas,
seguindo minhas trilhas, farejando meus vestígios,
tomando poeira em minhas estradas.
Parecia minha sombra, parecia em meu encalço,
de sôfrego, apercebi que era meu percalço.
Até que um dia... agarrou na minha carne,
apoderou-se da minha alma, ficou pegado a mim.
Saracoteei-me, bamboleei-me para repeli-lo... não consegui.
Resiliente que sou... e em combate, e em imensa luta,
e na descoberta... vi que era o passado... o que vivi.
O que não acabei... o que ficou por terminar,
ou achei que era o fim.
E acintoso cobrou-me desfecho, e riu do meu desleixo,
zombou da minha estupidez.
E em silencio, e depois que passou a raiva, ponderei...
busquei em retrospectiva, sensatez.
Saí... fui reparar respingos de desatenção,
retocar obras inacabadas, lagrimas suspensas no ar,
medos perdidos em noites de solidão,
derrotas escondidas, desejos a terminar.
Tive que concluir o passado...
E pactuamos jamais um romper com o outro,
ele transformou-se em recordação, e eu em perspectiva,
ele seguiu outro destino, e eu o meu.
Sou amanha, não sei retornar, nem voltar,
expurguei algumas coisas, compactei outras tantas,
e arquivei na alma... sou hoje...sou  vida,
sou um poeta a delirar.
Sou mais ousadia, tento sempre... todos os dias,
sou pura emoção.
Tive que concluir o passado... o deixei vazio,
metamorfoseei-me em futuro, mudo sempre,
adapto-me a todo instante,
sou evolução.

Ari Mota

sábado, 15 de janeiro de 2011

NÃO IMPERMEABILIZE A ALMA


A rudeza do dia... transforma-nos em autômatos,
repetimos gestos sem criar emoção,
não permitimos a delicadeza transpor a carne,
passar para dentro e tocar-nos profundamente,
e chegar a alma sem aflição.
Despertamos em defesa, portamos escudos, mascaras,
e em severidade omitimos o riso,
e colocamos aspereza no olhar,
inibimos o que descortina em afago,
e disfarçamos a leveza do acalentar,
petrificamos em gelo...
quando o destino nos brinda com a chance de amar.
Fingimos atitudes, formatamos imagens aparentes, vazias,
e de tão individualistas... tornamo-nos clandestinos no existir,
calculista no interesse, frios no mentir.
E ficamos assim toda uma vida... dissimulando brandura,
teimamos em desaplaudir outros talentos,
reinventamos distancias, afastamos da ternura,
perdemos-nos ao meio de tanto sentimento.
Escondidos e em medos... e em solidão,
não extasiamos diante de uma melodia,
nem encantamos... aos versos de um poeta,
nem deliciamos ao toque, ao que acaricia,
perdemos a força da contemplação.
Impermeabilizamos a alma...
Sem fôlego agonizamos em madrugadas frias,
temos vergonha de desmanchar em risos, em alegria,
em fuga, em disparada correria, e em pavor,
fugimos do encontro, dos abraços,  
dos beijos,
dos desejos,
e do amor.

Ari Mota

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

APRENDIZ DE MIM


Desde menino olhei o mundo com olhos de descoberta,
fui seduzido pelo inusitado, e ávido por saber,
refugie-me nos livros, nas narrativas, nos contos,
li em demasia...
fantasiei-me em personagens,
devaneei em madrugadas frias.
Perdi-me em noites de insônia,
interpretei poetas e seus poemas, sofri com seus dilemas,
chorei com sua dor,
fui despedida, fui partida, virei silêncio,
sangrei com os espinhos, solucei com os vazios,
e depois... e bem depois, acerquei-me do amor.
Mas... tudo foi palavras em fantasia,
gracejo de escritor, paixão em utopia.
Quando a juventude deu de assalto nos meus dias,
aventurei-me em aclarar os pensadores,
abonei inteligências, aplaudi o erudito,
pesquisei... deliciei-me com o enciclopedista,
acreditei em alguns, duvidei, desconfiei,
uns deixaram verdades, outros mentiram,
e muitos esconderam seus horrores.
Quando o tempo apoderou-se dos meus sonhos,
travou rugas na minha face, e roubou-me a ilusão,
tudo que li ficou apenas como referência,
histórias mal contadas, mentiras invertidas,
verdades adormecidas, gritos de solidão.
Hoje...
Redijo o meu destino, componho minha história,
ando esculpindo nas estrelas minha louca trajetória,
e... acho-me a cada dia.
Ando... preparando o meu fim,
carrego somente minha alma,
em verdades...
sou aprendiz de mim.

Ari Mota

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

SUPORTAR A FELICIDADE

Andei colecionando pranto, e guardando choro,
e dores inexplicáveis,
e todas as vezes que gotas jorravam dos olhos,
e desciam face abaixo, as depositavam em cavidades da alma,
em abismos insondáveis,
as escondiam em pingos, amontoavam-nas liquefeitas em solidão,
e em soluço, sozinho, morria de medo...
em aflição.
E fui surrado pela dúvida, hesitei no esboço do riso,
no tracejo do abraço, verguei-me ao cansaço
afastei-me do lúdico, improvisei o olhar,
em fuga abandonei o desejo, a doçura de um beijo,
fugi do improviso,
assustei-me com a incerteza do ousar.
Mas... tudo passou... como uma ventania.
Sangrei os meus abismos, esvaziei os meus vazios,
arremessei ao vento os meus soluços,
joguei fora os meus prantos.
Atrevo a ter coragem para ser feliz e amar,
às vezes em madrugadas de loucura... agonizo no gargalhar,
rasgo-me em rir... às vezes de mim mesmo.
Vago em devaneios chutando ondas na beira do mar,
brinco com borboletas azuis,
chuvisco gracejo nas minhas rosas vermelhas,
danço com minha louca bailarina ao luar.
Ando por ai... pulando de uma nuvem a outra,
belisco algumas estrelas, embriago-me de orvalho,
e em ventura... salto para dentro de mim mesmo,
em busca de horizonte, e não mais de atalho,
ouso colecionar verdades.
Hoje... além da coragem...
preciso ter força para suportar a felicidade,
e seguir minha viagem,
como um sonhador,
por que... como se não bastasse,
o destino me fez suportar em delícia...
o amor.

Ari Mota

domingo, 2 de janeiro de 2011

ROBUSTEZ DE ALMA


Que os rituais sejam respeitados, os ciclos experimentados,
mas, que a transformação, o renascer, o reinventar-se,
o despertar... aconteça em todas as manhãs.
Celebrar por períodos é demasiadamente longo,
podemos deparar com o risco do fim, o encontro da ausência,
e às vezes pode não dar tempo de ser feliz.
Portando... cuide da fugacidade do tempo,
da efemeridade das horas que impera,
da débil existência do destino... que pode não suportar a espera,
nem a ociosidade do desejo, do indeciso,
e lhe roubar o existir, furtar o sonho, matar o riso.
Não espere ciclos, nem estações...
Aconteça hoje... ame, dance, beije, abrace, ria, caia na folia,
ouse ser você, ultrapasse os paradigmas de si mesmo,
rasgue estas normas impostas a sua própria alma,
desancore suas emoções, desamarre suas ilusões,
dispa-se dos medos, ria dos fracassos.
Mude, renasça... reinvente-se,
e que sua mudança não venha de outros quintais,
nem de outros olhares, nem de reflexos de outros destinos,
nem seja baseada em outros modelos, nem em outras tentativas.
Que a sua mudança possa vir de dentro...
de dentro de você mesmo,
e sai para o mundo acompanhado de verdades... da sua verdade.
E que venha carregada de gestos autênticos,
e de abraços sinceros,
E não queira mudar costumes, nem persuadir vontades,
nem convencer, nem dissimular aparências,
ou demolir liberdades.
Desperte em todas as manhãs, em robustez, em festa,
como um sonhador,
não espere os ciclos, estações,
viva como se hoje fosse sua última manifestação
de amor.

Ari Mota