sexta-feira, 26 de agosto de 2011

A CORAGEM DE SER EU


Quando o brilho da meninice espelhava avidez nos meus olhos,
preparei-me para a guerra, para os conflitos sem fim.
Bem que minha coragem foi e é fruto das espadas que afiei,
bom mesmo foi que apenas temperei o corte, as afinei para a luta,
mas nunca as utilizei na incisão insana, nem sangrei a carne,
somente as guardei dentro de mim.
E por um bom tempo... fiquei indefeso,
vivi escondido em uma rua descalça... na solidão das gerais.
Temia... me perder se ultrapassasse a esquina da minha rua,
em cautela voltava sempre correndo... o inusitado me atemorizava,
presumia em alucinação ser vencido pelo caminho, que extenua.
E em desespero fazia do medo um refugio, do meu quarto um abrigo,
fiquei apavorado com o mundo, com a avenida desconhecida,
com a praça esquecida, com os becos adormecidos e outras vicinais.
E assim o destino um dia me empurrou ao acaso, em descortesia,
não tive outra saída, arranquei de dentro... toda a agonia.
E na descoberta, vi que de bárbaro nada tenho, sou apenas um poeta,
combato apenas com a escrita, uma gramática discreta.
Quando o ofuscar da meninice foi embora,
e o existir, esfolou-me a alma, arranhou o sonho,
fiz de mim um crescer, um ser que se aprimora.
Tudo foi muito lento, mas, aprendi que vencer é a arte da teimosia.
Atrevido, tive um olhar para fora, em demasia,
depois, ternamente olhei para dentro... de mim, delineei outros lugares.
Saltei os muros que moderavam os meus vôos, e inibiam os meus olhares.
Avistei outras existências, novos paradigmas e maravilhei-me com tudo,
rompi o temor de me perder, joguei fora as armas, o escudo.
Eu, que quando menino temia me perder na própria rua,
já fui um cidadão do mundo... hoje, tornei-me um ser universal.
Envelhecido, aprendi a amar o que sou,
ter a coragem de ser eu,
como não ficarei aqui para sempre,
de mim... só o amor será imortal.

Ari Mota

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

ANGÚSTIA

Se ao descortinar do amanhecer...
Sair provocando magoa no riso, sisudez no olhar,
e desaperceber a essência das coisas e das pessoas, entristecer.
E em vez de pasmar ao desassombro do existir,
maldizer a vida que se renova a cada despertar.
E em êxtase não viver o instante, como se fosse o último,
e em súplica, só pedir... em vez de agradecer.
Talvez...
Quando, ao sair de casa... não apercebeu que na esquina,
alguém lhe espiava,
na espreita, tomou-lhe o equilíbrio em assalto,
esvaziou-lhe os sonhos, esgotou a sua intrepidez.
E hoje... se notar um vão abrir e deixar um buraco no peito,
e um nó brotar garganta adentro, deixando tudo estreito,
pode ser um atentado, ou a solidão agarrando-lhe em altivez.
Saiba...
Certamente, você foi acometido pelos reflexos das tuas angústias,
feriu, ulcerou em silêncio a alma,
do sol fez escuridão... do destino, desilusão.
Não conseguiu separar o choro das lágrimas,
nem o passado do presente, soluçou desmedidamente.
Não musicou o pranto, nem dele fez uma melodia,
nem as lágrimas... transformou em brisa, em alegria.
Abandonou o combate, não teve coragem de ser feliz,
ficou no abandono de si mesmo.
Estreitou-se na ousadia, no recomeço, no medo de errar,
não suportou as pancadas que o destino iria um dia lhe entregar.
Se ao descortinar do amanhecer...
Uma inquietação lhe vier fazer companhia... isso é angústia,
dói sem ferir, machuca sem sangrar, nasce sem parir.
E não terás outra saída, a não ser... iludir a própria vida,
rir em demasia, renunciar aos perigos em fantasia,  
saltar no abismo das incertezas... com todo o destemor.
E depois... ouvir os bem-te-vis, voar com as borboletas azuis,
dançar com uma louca bailarina, olhar a todos e tudo com carinho,
e para si mesmo...
com amor.

Ari Mota

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

UMA PROPOSTA PARA AS DORES DA ALMA


Nada adiantará destilar as dores da alma... para o mundo,
imprescindível é desfilar com pertinácia o seu destino,
suporte este ardor que passeia dentro do peito, querendo sair.
Pode ser uma angustia descomprometida... um medo sem medida,
uma saudade de outra vida, uma vontade de fugir.
Se, contudo... nada adiantar, não a estampe no rosto,
nem a distribua... nem na cama, nem na rua.
Pode até afogá-la no próprio choro, ou esconde-la no próprio pranto,
mas, jamais a atire ao vento, ou a banalize em desencanto.
Que tenha todas as dores, e que sejam instrumentos do crescer,
e que fiquem ai dentro, nessa sua consciência íntima, até morrer.
Nada adiantará... destilar ao mundo suas dores, elas são suas,
talvez seja preciso... e tão somente,
fazer do silêncio um refúgio, da solidão um abrigo,
e que você mesmo... encontre uma saída.
Desvincule-se dessa massa débil que vaga sem saber aonde ir,
repartindo em caprichos seus desarranjos, seus desconcertos.
Basta... estanque esse seu desespero,
abandone essas mascaras invisíveis presas à cara,
desaposse dessa morbidez de alma, dessa tristeza no andar,
despoje essa insolência que carregas no olhar.
Há que se diferenciar dos outros... não necessita ser o primeiro,
nem carregar um selo de autenticidade... basta ser verdadeiro.
O mundo não quer saber das suas dores, ele aguarda suas propostas.
O universo te observa, te olha com fervor.
Proponha um novo caminho, reinvente os sonhos,
uma nova reengenharia de si mesmo,
destile harmonia, reenvie singeleza... equilíbrio.
E para os que te olham com desdém,
fita-os demoradamente, e em silencio... vá embora,
mas, antes... devolva-lhes um sorriso
de amor.

Ari Mota

sábado, 6 de agosto de 2011

DELÍRIOS DE UM POETA


Às vezes me desvisto dessa lucidez...
Dispo-me da embriagante ilusão do tempo, e te procuro.
Às vezes te olho... e te vejo menina,
outras vezes te busco, e te espero.
Não sei conceber-me sem você... que me fascina.
Ando sempre à procura daqueles momentos de loucura,
que guardei na alma e ficou perpetuado na foto envelhecida.
Sinto falta da doidice juvenil, dos desatinos da juventude,
da postura atrevida.
Tempos de devaneios...
Transpunha todas as barreiras e iria ao seu encontro.
Saltaria em dúvida... e em todos os abismos,
em busca do inusitado, dos meus desejos,
e depois... a procura dos seus afagos e dos seus beijos.
Eu sei, são delírios de um poeta em solidão.
São palavras soltas ao meio de tanta emoção,
não consigo voltar... nem viver esta aventura,
ficou difícil tomar em meus braços, o seu encantamento.
Tive que entender a distancia que nos separa,
redefinir a sua ausência.
Hoje tenho a sua presença apenas num espectro, em uma figura.
Às vezes te olho, e te vejo menina, que passou como o vento.
Outras vezes te busco, e te encontro em outro formato.
Às vezes me desvisto dessa lucidez... e a descubro,
em desvario, vagueando nos meus sonhos,
ou estampado na tela fria de um monitor ingrato.
Entre eu e você existe o tempo que nos afasta,
e a frieza estúpida de um retrato.
Mas, tudo é alucinação de um poeta,
que anda aqui dentro, dentro da alma, dentro de mim.
Mas, não tenha medo,
te amo...
mesmo assim.

Ari Mota