quinta-feira, 20 de novembro de 2014

A ESCASSEZ E OS EXCESSOS DO AMOR

Vez em quando... vem à memória,
os idos tempos, em que à míngua... eu andei,
quando a aridez tomou de assalto a minha alma,
e a tudo... desamei:
Virei folha seca, deserto sem fim,
abismo, poço sem água,
- e, era tudo... na verdade... escassez de mim.
E nesse fluxo e refluxo de coisas, dúvidas... até,
o destino... irônico como tal,
ofereceu duas vertentes, duas infinitas estradas,
e nesta busca... você já não sabe quem é,
e assim tudo chega... acontece,
e duas emoções instalam por dentro,
como se fossem... uma prece,
e perplexo... disperso, sem saber ,se... ama ou odeia,
perdido... nesta fronteira tênue,
descobre a demasiada condescendência de odiar,
desconstruindo outros sonhos, outros vôos...e a tudo pisoteia,
- e passa a existir da forma mais fácil... mais veloz,
e inicia a desdenhar outras alegrias,
e em vez de silenciar... enfim,
imprudente... grita... emudecendo a outra voz,
inibindo outros saltos... nos abismos de si mesmo,
e passa quase uma vida... sem amar.
Vez em quando... vem à memória,
os idos tempos... e confesso... já fui assim.
E hoje envelhecido... e sem rancor,
tenho poucos amores, e são intensos, imensos,
é que... ao longo do tempo... abandonei as mascaras,
sei que não consegui amar a todos como devia,
é que... fiquei célere, rápido como um relâmpago,
não demoro com quem não exala amor.
E hoje envelhecido... como um mago em descompasso,
aprendi que odiar é... acorrentar-se... a uma outra alma,
e deste medo eu não sofro, e esse não é mais o meu disfarce,
não fico preso em outro... destino, a espera de um ressarce,
amo em demasia... é o que eu faço.
Consegui me desgarrar destas pequenezas,
bom, foi que... embora o tempo tenha encarquilhado a pele,
esqueceu... e inadvertidamente...
abasteceu a minha alma de brandura, e singelezas,
desfiz todas as dúvidas... hoje já não sofro de escassez,
e o que me ultrapassa... é só o amor,
entrego-me tanto... que não sinto a minha falta,
tornei-me silêncio...    roubaram-me a insensatez,
não sou constância exacerbada, sou presença suave... sem fim,
descobri que amar é... tocar o intocável,
atingir o inatingível... e em resiliência redescobrir a alma...
que se recompõem diante de tanta doação,
é um desapego a infinitude... à solidão,
é o que de excesso... há em mim.

Ari Mota

sábado, 1 de novembro de 2014

A SOLIDÃO DA ÁGUIA

Amo... quem edifica pontes,
quem se constrói... só para esperar alguém,
quem desveste a fantasia... e vai ser feliz,
quem cansado... dos vazios,
atreve-se a encher a alma de amor,
e seus sonhos priorizam... sem ferir ninguém.
Amo... quem projeta pontes,
e permite... que passem nela sem ... tributos,
e livres... dançam em noites de isolamento,
aquietam-se em madrugadas de desespero,
não se lastimam... nem repartem a dor,
apreciam um novo vento,
e se renovam em todos os minutos.
Amo... quem em resiliência...
transformam-se em ponte,
e abrem caminho para a convivência,
jogam fora a mesquinhez das coisas,
e sabem o tamanho e a fugacidade do tempo,
e agigantam-se por dentro... com suas dúvidas e certezas,
entregam-se em demasia... em alegria,
sem medo do incomum,
e reconhecem a dimensão de uma ausência.
Amo... quem se transforma em ponte,
só para esperar por alguém que ficou para trás,
estendendo-lhe a alma... só para ele entrar.
Amo... quem não quis ficar pelo caminho... e sozinho,
não ter ninguém para...  esperar.
Amo... quem instalou uma ponte...
que o levasse para dentro de si mesmo...
em grandeza,
leveza,
só para... se encontrar.
Sabe...
amo as pessoas que carregam essa luz desmedida,
essa coragem... de tentar... quantas vezes... for,
em quietude... em solitude:
a sua essência, o... amor.
Sabe...
amo...  as pessoas que destilam forças de outras... vidas,
e não morrem na praça como uma pomba qualquer,
e nem... em vão.
Amo... quem... insiste... e continuam,
e são pessoas que iluminam a si mesmas,
mesmo sabendo...
que podem morrer como águia,
no pico mais alto,
na solidão.
Amo... aqueles que se doam... até o fim,
sem pedir... espere por mim.
 Ari Mota