segunda-feira, 26 de setembro de 2011

AS ESTAÇÕES DA ALMA


Um dia espiando a vida, procurando respostas,
ao meio das incertezas da meninice.
Deparei com um espectro sentado ao meu lado.
Segurava em minhas mãos, era pura meiguice,
olhava-me ternamente,
pura, um virginal abrigo, doce, inocente.
Quieta ficou ali... como se me roubasse o desespero,
e me revestisse de calmaria.
Caminhamos por dias, anos até... em silêncio.
Abraçava-me em noites de solidão, e eu a ela,
arrancou do meu peito o medo, e dos meus olhos a agonia.
Um dia disse-me, que se chamava: alma,
e que seria para sempre minha companheira.
Um iria necessitar do outro num processo cíclico do existir,
e que a coragem seria até o fim, nossa energia.
Eu e ela pactuamos... suportar os temporais, resistir.
Em uma tarde, nesses dias de recolhimento, de refugio, sozinho,
ao meio da natureza, e por analogia,
e na descoberta, vi... que também em mim sucede as estações,
e tudo se renova, se recompõe, se revela em beleza, e outros caminhos.
E desde então, fiz dos meus invernos um retiro existencial,
arquivo minhas vitórias, brinco com minhas derrotas, medito em remanso,
olho a vida com mais ternura, é o tempo que aqueço a alma,
e com ela... em devaneios, danço.
Quando chega o outono, vou colher os sonhos que plantei em demasia,
varro as folhas secas, recolho os frutos que caíram com a ventania.
Mas, vê que aproxima o verão, e como adquiri coragem para ser feliz,
corro na chuva, nos vendavais... abraçado com minha alma e a alegria.
Todas as estações são fundamentais, cresço por dentro,quando elas passam,
mas... só uma me fascina, me alucina, me acelera.
Encontro as borboletas de flor em flor,
bailarinas loucas... dançando na praça, com toda a graça,
em desejos... a procura do amor,
são tempos da sedução, dos ninhos em construção,
da primavera.

Ari Mota

terça-feira, 20 de setembro de 2011

A AUSÊNCIA DO SONHO DEGENERA A ALMA


Se fores acometido por um vazio estranho,
e uma desorientação invadir o seu existir...
E perdido achar que lhe subtraíram o tempo, o espaço,
e depois... não encontrar o horizonte e dele se distanciar.
E como se não bastasse romper de dentro uma estreiteza,
uma irritabilidade permanente, quase não agüentar,
e um desespero aflitivo, uma impaciência sem igual,
fazer tudo tornar-se tormento, um infinito temporal.
Saiba, não é ausência de fé... mas de sonho.
E entre eles... existe um abismo que os separam.
A fé não traduz a sua absoluta verdade, nem sua essência,
apenas e tão somente... uma crença,
em outros princípios que não são os seus.
Sonhar... é como se retirasse da alma a robustez da vida,
a energia que manifesta, que libera a consciência,
a coragem de não interromper o caminho.
Sonhar... é querer ter coisas,
sem ficar aprisionado na materialidade delas,
ter êxito sem escravizar-se aos títulos,
nem exibir-se com as honrarias.
Sonhar... vez por outra, aperta o peito, em solidão,
nas madrugadas, e sempre... morre-se de medo, de frio,
querendo um colo, um afago,
sentindo a brandura da carne, a morbidez da noite,
e o andar sozinho.
Sonhe... todas as fantasias, até as impossíveis,
não fique sentado na calçada do seu mundo,
esperando ao acaso, o destino lhe ofertar a sorte,
nem o trem do sucesso, parar para você subir.
Fundamental é exercitar os sonhos, se sacudir.
Só ele, manterá a sua originalidade,
o fará renascer a todo instante,  
e não morrer fragmentado de outros.
Quem sonha retarda a dor,
reconstrói as emoções, aprimora os desejos.
Talvez, falta-lhe... sonhar em demasia,
quem incorpora o sonho aos seus caprichos,
está... a um passo das suas conquistas.
Não espere... salte profundo nos seus ensejos,
a ausência do sonho degenera a alma,
desconstrói o amor.

Ari Mota

terça-feira, 13 de setembro de 2011

TEMPORAL

Foi como um temporal,
quase que imperceptível,
vivi quase que sem perceber o sentido da luta,
as batalhas foram assustadoras,
os dias passaram sem inicio e sem fim,
as noites mal dormidas... foram para descansar o corpo,
a alma necessitava de repouso, e eu não percebia.
As pessoas passavam como o vento, quase nem as notei,
o mundo mudou diante dos meus olhos, e não o vi.
As horas eram minhas terríveis inimigas, eu tinha pressa,
afoito quis mudar o mundo, as pessoas.
Atormentado dizia sim aos outros, e não a mim.
Atropelei as minhas vontades, tropecei nos meus desejos,
abri janelas que sempre me mostravam o nada,
e fechei portas que me levavam direto ao meu coração.
Caminhei por becos, vielas, avenidas e sempre a procura,
foram tantas as caminhadas,
esqueci... de encontrar comigo mesmo,
e de repente o meu eu necessitava de uma companhia,
que por incrível que pareça era o meu equilíbrio,
que eu não conhecia.
E quando o tempo iniciou a pintar meus cabelos,
a minha alma apareceu reclamando moradia,
percebi que não era a temível velhice,
mas docemente a experiência... batendo em minha porta,
e como uma eterna inquilina, apossou-se do meu ser,
e como numa entrega... fez-se dona da minha vida.
São quase 60 anos,
pode ser uma vida ou apenas o inicio dela,
mas a vontade de estar em quietação,
é indubitavelmente o que aprendi nesta inevitável existência.
Hoje... danço enlouquecido ao meio dos temporais,
salto livre... embriagado das dúvidas que ainda tenho,
e sem medo.
Brinco em devaneios com as ventanias,
sem jamais sentir-se no abandono, sozinho.
Parei o tempo... sou calmaria,
espio a solidão da noite e a minha.
Não tenho pressa, nem o fim me assusta.
Quando os temporais chegam dilacerando a alma,
resisto... insisto, cresço por dentro, sem ruir,
teimo em ser feliz,
amo existir.

Ari Mota

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

GENTILEZA


Se... um vazio em desesperança, continuar apertando o peito,
como se arrancasse do olhar o brilho, do andar os sonhos.
Se... tiver que provar o sabor do desespero e vigiar o riso,
e depois engolir a seco a solidão... perdido e não saber aonde ir,
não conseguir contemplar a maravilha que é... ser feliz, existir.
Talvez...
Será preciso... descobrir que tudo é finito,
e antes, que tudo acabe, tudo pereça sem você perceber,
deva sair... e olhar as pequenas coisas, a beleza comum,
imergir em uma nova maneira de viver.
Conceber o dia... com mais poesia,
descobrir que além do arco-íris tem... também alegria,
e ter um olhar gentil para o mundo, para você.
Saiba, sua abordagem diz tudo sobre o seu caráter.
Só por um dia... pare o seu mundo:
Mas, antes de apear-se dele, deixe nele algumas coisas:
E que sejam... só coisas, nada mais.
Abandone o relógio, a agenda, a voracidade financeira,
a impetuosidade do consumo, a soberba social.
Deve até esquecer algumas esquisitices, a sua chatice,
a sua infinita psicopatia que esconde, e acha que é normal.
Depois...
Dispa-se... das vestimentas, desvestida as máscaras,
desfaça os disfarces... saia com os pés descalços pelo mundo,
abra a carne e arranque dela a sua alma, retire-a deste casulo.
Faça-a, fluir desvairadamente ao infinito de você mesmo,
encontre-se, antes que perca a lucidez.
Ouça docilmente as pessoas, uma musica, sinta cada instrumento,
perceba um pássaro no jardim, e todos... cada gesto,
inclusive os seus... ria dos seus excessos, beleza incomoda,
a ausência dela também... mas ria... ria,
ria demasiadamente, brinque com a sua timidez.
Mas, se porventura fugir o sol, conte os pingos da chuva,
se não cair a neve que tanto gosta, observe o vento que toca sua pele,
maravilhe-se com o botão, mas deslumbre com o desabrochar da flor,
encante com as crisálidas, mas enlouqueça com o voar das borboletas.
Quando voltar ao seu mundo real, mude.
Coloque nele gentileza... um bom dia... um muito obrigado.
Experimente o amor.

Ari Mota

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

DESCONFIGURAR A ALMA


Quando pela madrugada, a insônia acomodar-se... ao seu lado,
e lhe vier fazer companhia, e de súbito encontrar-se sozinho,
olhando para a tela fria de um computador,
e a solidão encostar como uma amante desvairada no seu ombro,
assentar descomprometida em seu colo, em desalinho,
afagar seu rosto e confidenciar que te ama,
e lhe chamar de amor,
pode e deve entrar em desespero, se não suportar a dor.
Solidão é sentir o que não mais existe, é presenciar a ausência,
às vezes de si mesmo.
Mas, se uma lagrima rolar fase abaixo, num mergulho visceral,
e o soluço incomodar o silêncio que você precisa,
e um ardume brotar peito afora, dilacerando a calma.
É hora de desconfigurar a própria alma,
revisar o que assimilou, construiu, conceituou.
Tente historiar o próprio existir,
óbvio... terás que voltar, sondar o passado.
Remover... magoas, ressentimentos,
repaginar os sonhos, desmistificar os medos, e voar.
Pode ser para dentro... dentro de você mesmo, e te encontrar.
Tens na verdade... repartido seus vazios com os outros,
e agregado os deles... aos seus caprichos,
tens acessado a impolidez virtual, e as neuras coletivas,
e aceitado a estúpida descortesia dos que querem nortear seu rumo,
seus vôos.
Remova todo e qualquer resíduo de incerteza,
e ao desconfigurar a própria alma, por analogia,
formate-a criando uma nova interface, entre você e seu destino,
talvez lhe falte o risco de substituir a rudeza,
e ter um olhar para o mundo e para você mesmo, com mais delicadeza.
A fugacidade do tempo pode transformar tudo em agonia,
e sozinho... na madrugada, olhando em solidão para o monitor,
talvez, e possível é, olhar para a própria alma,
e colocar nela... mais,
amor.

Ari Mota