segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

OS MEUS RECANTOS

Foi-se o tempo...
que sempre voltava em retrospectiva,
tentava recolher os meus pedaços,
ou inadvertidamente colar um ao outro,
para esconder os meus fracassos.
Findou o ciclo... que transcrevia um poema, 
por comprazer e o revia em... exaustão,
corrigia uma rima... mudava uma expressão.
Perdeu-se o prazo, quando compunha uma musica,
e repaginava muitas vezes... a partitura,
alterava a melodia... para disfarçar a minha loucura.
Acabaram ao alento, os traços clássicos dos meus quadros,
as cores sóbrias... tudo aquilo que fugia do inusitado,
quando espelhava... nos outros, nunca em mim, o resultado.
Mas... um dia, não me recordo quando,
vasculhei os meus recantos... enfim,
esses vazios, esses espaços abissais, que carregamos,
e deparei com os meus sentimentos mais íntimos,
escondidos, perdidos... dentro de mim.
E depois, de tanto ser esfolado pela própria insensatez,
e ao meio das minhas batalhas,
aprendi a me dar... uns instantes de alívio... uma trégua,
e, é aí... que escrevo os meus poemas,
ouso as melodias que amo... que me fascina,
mudo os meus paradigmas, encaro os meus medos,
reconstruo os meus sonhos... que minha alma imagina.
E me... olho... demoradamente,
dou uma passada... no passado,
nada busco... nada deixo e nada trago,
e vejo que lá, não há vestígio deste que sou... hoje,
e naquele lugar, tudo fica... os desassossegos, as indelicadezas,
como não posso mudar o que passou... nada apago.
Mas... um dia, não me recordo quando,
encontrei-me... vasculhei os meus recantos,
e passei a renascer em cada fragmento que me resta,
em cada poema que deixo... em cada silêncio que faço,
em cada encanto que se manifesta.
Hoje... pareço solidão... mas é pura contemplação.
Consegui abandonar pelo caminho,
pequenezas, frivolidades... ninharias,
passei a não frequentar os lugares onde não existe amor,
e ando com pouca coisa, ando leve,
aprendi a me segurar nas ventanias.
E quando saio na chuva...
lavo a minha pele envelhecida, a alma atrevida,
e sem essas vaidades descabidas, recolho-me,
e nos meus recantos... fico... sem se ferir... ou ferir alguém,
e em lugar de dilacerar... provoco devaneios, em demasia,
e se for para sangrar... o faço, apenas...
com a tinta da minha caneta,
ao escrever... a minha poesia.

Ari Mota